De 10 a 30 de novembro de 2017, O Grivo – composto pelos artistas Nelson Soares e Marcos Moreira – e Roberto Freitas expõem a instalação Sonar, no balcão da Funarte de Belo Horizonte (MG), criada a partir de uma vivência dos três na Serra do Cipó (MG). A obra sonora foi produzida dentro do projeto Paisagem Sonora – Instalação Performática de O Grivo + Roberto Freitas, contemplado pelo Rumos Itaú Cultural 2015-2016, um dos principais programas de fomento à cultura e às artes brasileiras. No dia de abertura, os artistas apresentam uma performance que interage com a obra.
Sonar se desenvolveu em torno de uma pesquisa sobre a utilização do ar como força motriz para o funcionamento de uma série de objetos, engenhocas, engrenagens. Depois de um ano e cinco meses investigando e convivendo com a natureza, O Grivo e Roberto Freitas transformaram essa experiência em instalação com os ruídos, os ventos, a sonoridade que o ambiente proporcionava. Nela, o público entra em contato com sons graves – que remetem ao orgânico, à respiração, ao vento – e agudos, referentes aos elementos que circulam na natureza, como grilos e cigarras.
São três ambientes sonoros e visuais distintos. O primeiro é a de casa de máquinas ou pulmão. Trata-se de uma grande máquina composta por seis foles de sanfona que estão interligados por um grande eixo acoplado a um potente motor. O funcionamento dos foles, por si só, já produz uma sonoridade particular, onde os sopros de seis sanfonas, em proposital defasagem rítmica em função do tamanho diferente das catracas e correntes, gera uma polirritmia. A grande quantidade de ar proveniente deles acarreta em um ambiente denso e impactante.
O segundo é montado a partir de três tubos de madeira, como se fossem flautas, que produzem um som contínuo no registro grave, porém, leve, vaporoso, aéreo. É um assobio do vento controlado pela intensidade do ar. No outro ambiente, ainda é o ar quem impulsiona pequenas engenhocas, objetos musicais e engrenagens. Os movimentos de rodas, polias, hastes em equilíbrio sugerem sonoridades, criam ritmos, estabelecem texturas. São fios de ventos, ar a conta gotas.
Juntamente com a instalação foram criados instrumentos, que serão tocados no dia de abertura pelos artistas em uma performance de interação com os sons da obra e com o público presente.
Não se trata senão
de soprar
E sopro
não é sempre
nem é somente sopro
Mas também
sempre
Ressonância
E para isso ou nisso
nesta operação
ou neste jeito
há desdobramento
em movimento
Ar no ar
reenvio de um elemento ao outro
ou outro ou noutro ou
uns contra os outros
neste entre ou antro
Estado de coisas
em acordo e desacordo…
I
Atividade do ar,
ar que nos alimenta
e que nossos olhos não veem
Faz erguer o mar
Desenraíza árvores
Derruba os homens
De ímpeto veloz,
noturna impaciência…
Deixe soar o vento
na fala das folhas
no cortinado das janelas
na leve luz das velas
no cabelo das mulheres
II
Traço do ar:
Instável, movediço, vacilante…
:
Uma vez mais, volta
revolta
Giro impreciso, indireto
Indecisão impassível que range
a pulsar,
resvalar, estalar…
III
Há a corrente de ar cortante
a aura suave
a viração
Vento
em toda sua escala de intensidades:
Calmo
Leve
Fraco
Moderado
Fresco
Forte
Muito forte
Tempestuoso
Furacão...
Medidas do ar em movimento
Parâmetros musicais para o vento
IV
Dançar
Rodopiar
Como uma lasca de madeira presa a um fio de teia de aranha…
Tudo dança
na árvore que balança
V
Voz que ressoa
pelo oco
pelas frestas
Onda
entre
Onde há
espaço
E onde
anda o deslocamento
VI
Vento a conta gotas:
Conta vento
VII
Tênue fio de vento
Via de quase fumaça
Desvio do agora
Matiz em nuances
VIII
Articulações, encadeamentos
Pontuações
Indizível cálculo de todas as ordens
Mistura cromática
para além do acordo
ou da harmonia
Além do sentido
do engenho, da engrenagem
Onde sopra a
Escuta:
Eco
Sombra do som
Estado de reenvio sem fim
Perspectiva aberta em seu endereçamento
Música por acaso
Por acaso música
IX
Vento
Como um pulmão mecânico
a mover e fazer-se mover
Vento
Um mundo em movimento
Vento
A fazer vibrar
Vento
A soprar
Sopro
O tempo é um sopro